O aperto orçamentário enfrentado pelo governo federal tem causado impacto direto no funcionamento das agências reguladoras. Com orçamento reduzido, esses órgãos acumulam filas, cancelam certificações e perdem capacidade de fiscalização. O jornal O Estado de S. Paulo publicou o levantamento nesta sexta-feira, 6.
Em muitos casos, restou aos gestores concentrarem esforços apenas no que é considerado essencial. Entre 2016 e 2025, os recursos disponíveis para as agências caíram de R$ 6,4 bilhões para R$ 5,4 bilhões, em valores corrigidos pela inflação.
O número de autarquias também aumentou de dez para 11. Quando se excluem os gastos fixos com pessoal, a retração chega a 41%, de acordo com dados do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento.
A maioria das reguladoras opera hoje com verbas de custeio e investimento em patamares mínimos. A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) teve seu orçamento reduzido em quase 65%.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) perderam mais de 40% de seus recursos.
Em meio à escassez, o Ministério dos Transportes precisou transferir R$ 18 milhões para socorrer a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) no ano passado.
O impacto chega ao consumidor. A Anac, por exemplo, informou que o atraso na certificação de aeronaves da Embraer pode elevar o custo das passagens aéreas.
Provas para pilotos quase foram suspensas por falta de repasse à Fundação Getulio Vargas. Na Saúde, a Anvisa enfrenta dificuldade para aprovar novos medicamentos por causa da queda no número de servidores e no orçamento.
Redução de verbas põe em risco a segurança pública
O quadro de pessoal também está em declínio. A Anvisa perdeu 600 servidores desde 2016 e hoje tem apenas 1,4 mil funcionários. O mesmo se repete em quase todas as agências, com exceção da ANA. Todas tiveram redução real nas verbas destinadas à folha de pagamento.
Segundo o presidente do Sinagências, Fábio Rosa, a situação já ultrapassou o limite do aceitável. Ele afirma que tragédias como as de Mariana e Brumadinho mostram o preço da fiscalização enfraquecida.
Rosa também alerta para um risco menos visível: sem capacidade de ação, as agências deixam de estruturar mercados e fomentar investimentos.
Governo promete reforço, mas agências seguem fragilizadas
Em nota, o Ministério do Planejamento se recusou a comentar os dados. Já o Ministério dos Transportes confirmou a contratação de novos servidores para a ANTT.
O concurso de 2024 abriu 50 vagas imediatas e prevê o chamamento de outros 70. Ainda assim, o órgão ficará menor do que há dez anos — mesmo com o dobro de concessões rodoviárias em operação.
Hoje, são 32 contratos ativos e a previsão é que o número ultrapasse 60 até o fim de 2026. A fiscalização dessas empresas exige presença constante da ANTT em trechos estratégicos, o que não ocorre por falta de estrutura.
Para o secretário-executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro, a situação da ANTT é crítica, mas ele evita generalizações: “Não tenho claro se isso é um problema de todas as agências”, disse.
Congresso cobra mais eficiência e autonomia para reguladoras
O deputado Júlio Lopes (PP-RJ), presidente da Frente Parlamentar pelo Brasil Competitivo, defende a blindagem orçamentária das agências. Ele cita o caso da ANP, que cogitou parar o monitoramento da qualidade de combustíveis: “Abrir essa guarda é um convite à pirataria”.
“Estamos vendendo o almoço para pagar o jantar — e, às vezes, ficamos sem café da manhã”, disse Júlio. Para ele, emendas impositivas e bloqueios sucessivos de verbas agravaram a instabilidade.
Apesar de reconhecer a urgência em recompor recursos e pessoal, Lopes defende a ideia de que as agências revejam suas estruturas. Ele propõe digitalizar serviços para reduzir custos e aumentar a eficiência.
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